Portugal aos olhos de Duarte Belo

Portugal aos olhos de Duarte Belo

Da arquitectura herdou o gosto de dar vida e forma às coisas. A fotografia nasce, depois, como uma extensão e um meio para algo maior. Desde 1980 que Duarte Belo, em companhia ou muitas vezes sozinho, parte à descoberta da identidade do nosso país. Desde a paisagem que se mantém intacta às marcas que o homem tem vindo a deixar na terra, como a arquitectura. De Norte a Sul do país, foram muitos os quilómetros e as noites solitárias no campo que deram origem a um imenso e impressionante arquivo de diários e fotografias. Um trabalho singular e uma forma especial de descobrir e conhecer Portugal e a sua história.

DESENHO DE TEMPO E ESPAÇO
Uma viagem imaginária. Caminhar. Partir da Quinta Dos Murças, Covelinhas, Douro, em direcção à Herdade Esporão, Reguengos de Monsaraz. Uma longa viagem pedestre. Como que a exploração de um território desconhecido, ou o avançar por caminhos esquecidos. Estar próximo da terra. Gargantas profundas abertas pela torrencialidade dos rios do norte. Penedos ciclópicos de mitos desvanecidos. E sobre as pontes mais antigas atravessamos os vales na direcção do topo das montanhas. Sob a copa das árvores procuramos abrigo. Há templos ao longo do itinerário. Construções muito antigas para a reinvenção, hoje, de um significado possível. Castelos levantados sobre a grande planície do sul.
Do Douro ao Alentejo. Há uma enorme extensão de território entre estes dois pontos, mesmo como que países diferentes mas, simultaneamente, estranhamente semelhantes. Sobre esta linha pressentimos o infinito, mas há um imenso país que fica fora deste lugar longilíneo. É a diversidade próxima e múltipla.
Este é o desenho de uma viagem nunca feita. Alinhamos, agora, as palavras para um projecto imaginário. Dessas viagens antigas apenas traria fotografias, nunca palavras escritas. Houvera uma permanente imersão na natureza perplexa de um mundo de espanto, de surpresa e inquietação. Construímos uma narrativa, uma sequência de lugares que são fragmentos do passado, de viagens reais, de décadas de caminhar solitário.
Reflectimos sobre um espaço concreto, um país, sobre uma determinada condição do viajante, sobre partida deliberada com poucos recursos, para a imersão na Natureza. De algum modo apontar outras formas de leitura e interpretação dos territórios, de exploração do visível, da matéria, da procura de uma relação humana muito arcaica com a terra. Uma condição de despojamento leva-nos a focar o olhar na eventual essência da matéria e, ao mesmo tempo, na dureza da luta pelo dia seguinte, representação, da própria sobrevivência em campo aberto. Dialogar com um passado humano, apenas possível de imaginar, na sua dificuldade extrema. Mas há paradoxos em tudo isto.
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Rio Varosa
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Serra de Leomil
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Rio Dão
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Serra da Estrela
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Serra da Gardunha
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Ribeira do Alvito
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Conhal do Arneiro
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Arez
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Flor da Rosa
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Fronteira
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Candieira
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Montoito
Paisagens pouco povoadas, reservas de vento, liberdade e solidão. Lugares de tranquilidade e a proposta de formas de vida menos saturadas de ritmos opressores. Paisagens de paz, do tempo longo e da integração numa ideia de Natureza que não é acessível nas grandes cidades. Contemplação. A vida é também feita de viagens-desenho, somatório de fragmentos perdidos de outros movimentos. Somos matéria de memórias e sonhos.
Regressar. Voltar a atravessar os vales profundos, lavar a cara nos rios do inverno, procurar a sombra dos caminhos, observar os gestos de povoamento milenar deixados nas paisagens, subir ao cume nevado das mais altas terras. O sul será um horizonte de estio. Pernoitamos no deserto sob a abóbada celeste. Frio. Ao raiar da aurora, reerguemo-nos para um horizonte renovado. Só muito mais tarde entenderemos o inesgotável fascínio do planeta que habitamos. Construímos um cosmos em perpétuo movimento, imensamente frágil. Contraditório.

 

Texto por Duarte Belo

Outubro 2017

Herdade do Esporão, por Duarte Belo
Herdade do Esporão

da quinta dos murças à herdade do esporão

Portugal aos olhos de Duarte Belo

 

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